[Resenha] Guerreiros da Tempestade – Crônicas Saxônicas

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Sinopse Uhtred de Bebbanburg comanda a guarnição do burh de Ceaster, uma poderosa fortaleza no norte da Mércia construída pelos romanos. O poder da senhora Æthelflaed na região se expande, o que atrai olhos cobiçosos. Ragnall, o Cruel, reúne forças irlandesas e nórdicas no maior exército que jamais ameaçou o universo saxão. Com isso, a solução de Æthelflaed é colocar suas forças no interior de Ceaster para resistir aos ataques inimigos.Porém, quem será capaz de manter Uhtred entre as paredes de um burh quando sua filha, casada com Sigtryggr, irmão e inimigo de Ragnall, é colocada em perigo?

Na luta entre deveres familiares e lealdade aos seus guerreiros, entre ambições pessoais e compromissos políticos, não há um caminho fácil. Mas um homem com a coragem de um verdadeiro guerreiro é capaz de trilhá-la.

Autor – Bernard Cornwell

Lançamento – 2016 (Brasil)

O nono livro de As Crônicas Saxônicas, chamado Guerreiros da Tempestade foi lançado o ano passado no exterior, mas chegou somente esse ano ao Brasil.

Para os ávidos leitores de Cornwell e apaixonados fãs de Uthred, a espera sempre gera expectativa e ansiedade. Gerou muita ansiedade em mim, pois em O Trono Vazio percebi elementos que me cansaram.

Para quem não se lembra ou ainda não leu, no ano passado eu falei sobre O Trono Vazio. Chamo a atenção para meu post anterior, pois minha opinião aqui é reflexo do que já havia dito lá atrás.

Guerreiros da Tempestade era um livro em que eu apostava bastante. PE não é para menos, pois anualmente quero estar em uma parede de escudos. Quero estar em uma batalha onde cavalos fazem o chão tremer e espadas retiram tripas, medo e lágrimas.

Cornwell me proporcionou isso, e como proporcionou. Porém, faltou algo. E é sobre esses altos e baixos que quero falar agora…

Uhtred, o wyrd, deus ex machina e a Inglaterra

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Nesse volume todo vemos Uthred tendo que acabar com uma nova ameaça, uma ameaça chamada Ragnall.

Até aí podemos pensar: Mais um nórdico que decidiu tomar para si alguma parte da Nortúmbria. Será que isso não vai acabar?

A resposta é: Sim e Não.

Sim, pois realmente mais um pretenso senhor viking quer reclamar para si, uma porção de terras inglesas.

E não, pois Ragnall não é qualquer nórdico, ele tem um passado. Ele é irmão de Sigtryggr , aquele que vimos em O Trono Vazio e que agora é ex-inimigo-atual-genro de nosso amado Uhtred.

Acho que esse vínculo entre eles foi o que mais me agradou. Um fagulha acendeu minha curiosidade novamente. Senti que veríamos o wyrd rondando cada capítulo de Guerreiros da Tempestade e vimos. Gostei de ver como o destino entrelaçou-se entre os personagens principais, pois o livro fala sobre laços.

Laços familiares, laços amorosos. Sejam antigos, sejam atuais. O livro nos mostrou como funciona a mente das fiandeiras.

Existe trama mais costurada do que essa?

O livro traz a ligação de Ragnall com Sigtryggr, e consequentemente a ligação com Stiorra que, por sua vez, se conecta com Uthred.

Ragnall tem o apoio do irlandês Conall, que é irmão de Finan, que por sua vez está ligado à Uthred desde quando ambos eram escravos em um navio.

O nórdico ainda tem o apoio de Brida, sim nossa querida Brida. Quer mais laço afetivo do que aquele forjado entre Brida e Uhtred em O Último Reino?

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Brida se vinga de Uhtred ferindo seu filho mais velho.

São essas ligações que tinha de tudo para nos proporcionar momentos épicos. E tivemos tais momentos.

A atitude soturna de Finan quando soube que seu irmão estava na Inglaterra e a consequente luta entre  eles. O momento em que Brida e Stiorra se enfrentam. Uthred e Sigtryggr lutando lado a lado.

Foram cenas que me lembraram a magia que vi em As Crônicas de Artur, há tantos anos atrás. Me empolguei com o cenário montado, porém o desenvolvimento do outro lado da trama não me empolgou.

Uthred corre entre a Anglia e a Nortúmbria tentando prever (e com sucesso) os planos de Ragnall. Como se não bastasse os acertos milagrosos de Uthred, em contrapartida vemos um pequeno (ou quase invisível) desenvolvimento envolvendo o filho de Alfredo. Parece que não existe mais política na Inglaterra. quanto mais nos aproximamos da realização do sonho de Alfredo, mais parece que o território da Inglaterra se torna terra de ninguém.

As fiandeiras parecem saber tecer o destino de todos, mas acho que elas tem um apreço grande demais em interligar o destino de toda a Inglaterra ao wyrd de Uthred.

Se antes Alfredo era uma figura proeminente, que antagonizava com nosso protagonista, gerando momentos memoráveis, hoje não existe mais isso. Sim, sei que Alfredo está morto. Porém até mesmo Athelflaed, que tem uma personalidade forte o bastante para seguir os passos do pai, em Guerreiros da Tempestade passou a ter um papel totalmente secundário.

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A Igreja se tornou uma piada e sua força questionadora não mais atinge os atos de Uhtred. Se antes ele tinha a Igreja para frear seus atos, ou criar obstáculos a serem transpostos, hoje não existe força capaz de limitá-lo.

Outro fato que me incomodou é que todos, absolutamente todos cristãos parecem extremamente tapados frente à Uhtred.

_ Padre Haruld, você está convencido da conversão do jarl Haesten?

_ Estou, senhora. Ele derramou lagrimas de contrição e de júbilo no batismo.

_ Que Deus seja louvado! sussurrou o padre Ceolnoth.

_ Chega! exclamei. Ainda empunhava Bafo de Serpente.

[…]

_ O jarl Haesten implorou lealdade à senhora na missa de Páscoa. Chams no rio – Guerreiros da Tempestade

Sem falar, da necessidade de se demonstrar pagão.

Eu acho interessante essa postura dele, porém 9 livros depois, nosso protagonista ainda tem a necessidade de nos lembrar disso.

— Mas nós temos o senhor! E o senhor esmaga os pagãos!
— Eu sou pagão! “Guerreiros da tempestade – Crônicas saxônicas – vol. 9.”

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Disse que estava esperando a festa de Eostre para converter os outros, mas olhe para eles! São pagãos como eu. Haesten mente. Ele sempre mente. “Guerreiros da tempestade – Crônicas saxônicas – vol. 9.”

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— Eu sou pagão! — declarei com raiva. — E Stiorra também!” “Guerreiros da tempestade – Crônicas saxônicas – vol. 9.”

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— Eostre! — falei, interrompendo-o. — Deusa da primavera! Deusa de fazer bebês! Vocês, cristãos, roubaram o nome e a festa dela!
— Ignorem-no — disse Ceolnoth, mas ele sabia que eu estava certo. “Guerreiros da tempestade – Crônicas saxônicas – vol. 9.”

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— E é tempo de Páscoa — comentou Glædwine, quase consigo mesmo.
— Festa de Eostre — corrigi. “Guerreiros da tempestade – Crônicas saxônicas – vol. 9.”.

O deus ex machina opera quando Uhtred entra na Irlanda, rouba barcos de Ragnall, salva Stiorra e seu genro  de um cerco, retorna para a Inglaterra, são e salvo e com um exército maior do que aquele que tinha inicialmente (sem falar dos juramentos que os noruegueses quebraram para estar ao lado de Uthred).

Com isso é impossível sequer temer que, na batalha final de Guerreiros da Tempestade a força de Ragnall poderia fazer frente à Uhtred. A linda parede de escudos não foi suficiente para me fazer temer.

Acho que esse é o sentimento que me tomou quando terminei de ler.

A falta de medo.

Conclusão

Uhtred se tornou alguém tão intocável que com suas ações heroicas se afasta dos outros personagens importantes de tal maneira, que os mesmos parecem ter perdido o brilho, a essência.

Aliado ao fato de que nosso protagonista não erra e que todos seus pressentimentos são corretos, parece ser apenas uma questão de tempo para que a Inglaterra se forme, finalmente.

O grande problema é:

Quanto tempo? Quantos livros mais teremos?

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Não, eu não estou menosprezando a obra de Bernard Cornwell. Não, eu não deixei de gostar de Crônicas Saxônicas. Cornwell é e sempre será um dos meus autores favoritos, e Crônicas Saxônicas é e sempre será uma das minhas séries favoritas.

Não me entendam mal. O livro é bom, escrito de uma forma muito boa e tem uma narrativa que fascina.

Porém, acho que quanto mais a saga se estende, mais força ela perde, menos épica ela se torna.

Me preocupa perceber que se um dia Uthred demonstrou ser um personagem mais cativante do que Derfel, hoje percebo que Derfel é mais falho, mais humano, mais real e, consequentemente, mais querido por mim.

De qualquer forma, o gancho para o próximo volume me parece promissor. E eu gostaria de ver Uhtred focando toda essa maestria, invencibilidade e sorte grande para a retomada de Bebbanburg.

Acredito que esse seja o único objetivo que me mantém acompanhando a série. Isso e paredes de escudo.

Nota – nota-3

2 Comentário

  1. 10 de novembro de 2016    

    Grande, Drunk!

    Concordo com você. Acredito que a série tem se arrastado. E, nunca poderia pensar isso: Alfredo faz falta! Haha!

  2. Sunamita Leite Sunamita Leite
    21 de dezembro de 2016    

    Acabei de ler ontem o livro. Amo Uhtred e sua saga, mas eu também estou ficando cansada de esperar que ele consiga seu objetivo principal, recuperar Bebbanburg. Concordo com você em tudo que disse, tive cada uma dessas impressões também. Vou continuar até o final, mas que não seja uma saga tão longa quanto a de Sharpe…
    Tô achando os livros mais curtos, como se estivesse “enrolando” para lançar mais volumes. Poucas coisas importantes a cada livro, do sétimo para cá. Adoro estar na parede de escudos, vendo toda a ação, mas algumas coisas estão ficando muito batidas e previsíveis, como vc disse. Aí perde um pouco da graça.

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